Juliana Gil

O cão na nova família: o que precisa mudar no mercado

Escrito por Dra. Juliana Gil

22 JUN 2022 - 19H05 (Atualizada em 19 JUL 2022 - 10H49)

Nas últimas décadas, o cão assumiu um papel na família moderna, chamada atualmente de família multiespécie. Ele agora é parte essencial e central na família, e seu bem-estar é motivo de preocupação e cuidados. Pode parecer simples a mudança, mas ela traz um impacto direto na maneira de oferecer serviços e produtos para essa nova família.

O cachorro vem acompanhando o ser humano por toda história, oferecendo companhia, lealdade e segurança. Na história evolutiva humana, os animais domesticados sempre foram valorizados pelos serviços e recursos econômicos que nos proporcionavam. Porém, atualmente, a decisão de ter um cão parece estar mais ligada ao suporte emocional que eles nos proporcionam. Diversos trabalhos científicos realizados durante a pandemia atestam que ter um cão ajudou as pessoas a lidarem melhor com a tristeza, isolamento social e depressão.

Os números de cães nas famílias humanas vêm crescente de forma vertiginosa, inclusive em tempos de pandemia. O Brasil tem a segunda maior população de cães em todo o mundo, são 54,2 milhões de cães (Instituto Pet Brasil, 2018). Seus donos costumam explicar que o novo membro da família lhes dá amor e apoio social.

Sob essa nova perspectiva, o tratamento dado a eles vem mudando radicalmente, principalmente nos últimos 40 anos. Eles deixaram de ser “apenas” animais de serviço e assumiram status dentro do núcleo de familiar, gerando em seus tutores um sentido de responsabilidade e promovendo uma melhora no manejo deles. Isso foi determinante para um aumento do tempo e qualidade de vida dos cães e claro, maiores investimentos econômicos no pet.

Mas nem sempre foi assim, por muito tempo, a própria ciência negou aos animais a capacidade de ter emoções e memória (embora Darwin já defendesse isso há dois séculos!), o que justificava perfeitamente o modo como eles eram tratados. Na faculdade de veterinária, nós aprendemos a fazer contenções em cães que eram verdadeiras barbáries e quando isso fosse questionado, a resposta era certa: é necessário e ele nem vai lembrar. Nossos cães comiam sobras de comida e viviam com poucos cuidados médicos, de forma geral nas áreas externas das casas.

Com os avanços da ciência, mas também com a relação mais íntima e direta entre humanos e cães dentro de casa, fica claro que sim, eles têm memórias e emoções (muito semelhantes as nossas!), o que nos remete diretamente ao questionamento sobre como podemos seguir atendendo e tratando eles como antes? Façamos uma reflexão de quantos cães são diariamente traumatizados durante o atendimento veterinário ou no serviço de banho e tosa, e o quanto isso pode impactar nos tutores evitarem levar seus animais a clínica veterinária/petshop por conta do estresse.

O modelo negócio da área pet, que tratava o cão apenas como uma ponte até o humano, buscando agradar pessoas e cães, usando apenas artifícios humanos está ultrapassado. O ambiente de negócio agora precisa ser agradável aos olhos humanos, mas também aos olhos caninos.

As famílias querem tratar seus cães em clínicas e hospitais, que disponham não apenas de conhecimento médico, mas também empatia e manipulação gentil dos seus filhos (Já imaginou pedir para a mãe sair do consultório para realizar a vacina no seu filho?). Da mesma forma o banho e tosa, precisa ir além de um local limpo e transparente, ele vai precisar de profissionais preparados para esse manejo de baixo estresse e claro de um espaço adequado não apenas aos humanos, mas principalmente para os cães da família (manter eles presos em gaiolas de aço minúsculas, por exemplo!). O alimento, agora vai além de uma questão nutricional e passa a ser visto como um item que pode garantir uma vida mais longa e saudável para o animal. Os brinquedos, que antes eram apenas um agrado, são hoje ferramentas para estimular cognitivamente e fisicamente, de modo a promover qualidade de vida e bem-estar para toda a família.

Justamente para atender esse novo cenário que começa a ganhar espaço, programas de manejo de baixo estresse para cães, tanto no ambiente médico, como na área de banho e tosa. O diferencial desses novos negócios são justamente a aplicação dos novos conhecimentos científicos sobre as necessidade e perspectivas dos cães, de forma a oferecer um serviço de qualidade e menos estressante para humanos e cães. Estudos realizados em outros países mostram que essas clínicas adaptadas e com equipe preparada para o atendimento de forma “humanizada” tem maior fidelização de clientes e melhores rendimentos, mostrando uma tendência de mercado.

A pergunta é: seu negócio está agregando qualidade de vida para a família multiespécie?

Boleto

Reportar erro!

Comunique-nos sobre qualquer erro de digitação, língua portuguesa, ou de uma informação equivocada que você possa ter encontrado nesta página:

Por Dra. Juliana Gil, em Juliana Gil

Obs.: Link e título da página são enviados automaticamente.